sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Net Educação: texto sobre Dom Casmurro, de Machado de Assis

A narrativa unilateral não segue uma ordem linear, cronológica, e sim psicológica.
Autor
Filho de Francisco José Machado de Assis, operário e mulato, e de Leopoldina Machado de Assis, Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro em 21/6/1839.

Órfão de mãe muito cedo, foi criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata. Sem meios para frequentar cursos regulares, estudou como pôde. Consta que suas primeiras lições de francês foram ministradas por uma senhora francesa, proprietária de uma padaria. Desde cedo, Machado aproveitou as poucas oportunidades de ensino que teve e obteve a maior parte dos seus conhecimentos pelo estudo autodidata.

Com a morte do pai, em 1851, Maria Inês empregou-se como doceira em um colégio do bairro onde moravam, onde também trabalhou Machado de Assis. No colégio, teve contato com professores, e alguns biógrafos apontam que, provavelmente, tenha assistido a algumas aulas nos momentos em que não estava trabalhando.

Em 1856, entrou para a Imprensa Nacional, como aprendiz de tipógrafo, onde conheceu Manuel Antônio de Almeida. Em 1858, tornou-se revisor e colaborador do jornal Correio Mercantil e, em 1860, recebeu o convite de Quintino Bocaiúva para trabalhar na redação do Diário do Rio de Janeiro. Nesse período, tem início a vasta produção literária de Machado de Assis, que escreve em jornais e revistas da época, ora como crítico, ora publicando contos e poesias.

Em 1869, casou-se com Carolina Novais, com quem, de acordo com a maior parte dos dados biográficos, viveu uma união feliz. Em 1881, com a publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas, sua carreira literária toma vulto e ele passa, efetivamente, a receber o devido mérito.

Em 1897, torna-se presidente da Academia Brasileira de Letras, tendo sido um de seus fundadores. Morre em 1908, deixando vastíssima produção em praticamente todos os gêneros literários.

Seu estilo, inicialmente apresentando características românticas, aprimora-se após a publicação de Memórias Póstumas, de modo que pode ser definido pela visão objetiva e pessimista da realidade, pelo estilo conciso, pela análise psicológica de seus personagens – reveladora das contradições humanas –, pela ironia e pelo humor que permeiam suas críticas.
Contexto e análise da obraAntes que se inicie a análise de Dom Casmurro, é importante que se compreenda o contexto histórico e as características do movimento a que a obra pertence.

O Realismo, movimento literário que se inicia na segunda metade do século XIX, como reação ao subjetivismo do Romantismo, teve como marco, no Brasil, a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, por Machado de Assis, em 1881. Influenciado fortemente por teorias científicas da época (ao que chamamos aqui de cientificismo), o movimento caracteriza-se pela busca de uma abordagem objetiva da realidade, por análises por meio da ciência e pelo interesse por temas sociais. Para os adeptos do movimento, a sociedade estava cheia de problemas que precisavam ser diagnosticados (de forma objetiva e verossímil, por isso, através da ciência) para que pudessem ser resolvidos: e este era o papel dos realistas, diagnosticar, mostrar o que verdadeiramente acontecia, sem as idealizações dos românticos.

No entanto, cada autor enfoca e desenvolve esses princípios a sua maneira. Aluísio Azevedo focou nas patologias sociais, explicadas sob a ótica determinista; Eça de Queirós na hipocrisia da sociedade e dos seus papéis.
Machado de Assis cria um estilo completamente novo e próprio com base nos preceitos realistas. O cientificismo do movimento toma forma nas obras do autor por meio da análise psicológica; a crítica à sociedade desenvolve-se a partir daquele que a constitui, o homem: assim, as análises do autor enfocam a constituição moral do ser humano.

E esse é o caminho para se compreender Dom Casmurro. A narrativa não segue uma ordem linear, cronológica, e sim psicológica, ou seja, o mais importante, a alma da obra, não está propriamente nos fatos, mas na constituição psicológica e moral de seus personagens. Machado cria uma narrativa completamente unilateral, só conhecemos a visão de mundo de Bento, os fatos seguem a sua perspectiva, e a própria narrativa é secundária em relação à análise do personagem.
Resumo do enredoO enredo de Dom Casmurro começa pelo final e se desenvolve em flash-back. Dom Casmurro é o apelido que Bento Santiago recebe, sarcasticamente, de um conhecido que se sente desrespeitado pela sua falta de disposição em ouvir os versos que compôs. Assim, o apelido torna-se motivo de piada, e Bento acaba por aceitá-lo, afinal, combinava com a sua personalidade – Casmurro significa calado, metido consigo.

Dom Casmurro, velho solitário e frustrado com a vida, busca por meio da narrativa rememorar e compreender fatos do passado: o romance com Capitu – com quem viria a se casar –, o seminário, o relacionamento com os familiares e amigos, o casamento desfeito - enfim aquilo que transformou o menino puro e ingênuo no velho solitário e infeliz.

A vida de Bento transcorre sem grandes incidentes até uma tarde, em 1857, quando ouve o seu nome ser pronunciado e se esconde para escutar do que se tratava. Sua mãe, dona Glória, conversava com José Dias, agregado da família, sobre a intenção de colocar o filho no seminário, em virtude de uma promessa que fez ainda grávida, por ter perdido o primeiro filho.

Surpreso, Bento corre para contar a Capitu – vizinha, amiga e primeiro e único amor de sua vida. O conflito os aproxima ainda mais, e eles juram no futuro se casar. Para isso, elaboram planos para evitar a ida ao Seminário. Capitu, sempre esperta e racional, elabora os melhores planos, enquanto Bento, inexperiente e ingênuo, tem apenas ideias mirabolantes – como falar com o imperador.

Apesar dos esforços, e da ajuda de José Dias, eles nada conseguem, e Bento vai para o Seminário. Lá, faz um amigo: Escobar, com quem troca confidências e passa a frequentar-lhe a casa. E é esse amigo que propõe uma solução ao caso de Bento: se D. Glória prometera a Deus um sacerdote, porque não outro filho, adotivo?

Assim, Bento sai do Seminário e parte para São Paulo a fim de estudar. Em cinco anos, volta advogado e casa-se com Capitu; ao passo que Escobar se casa com Sancha, amiga de infância de Capitu.

Casado, Bento vai se mostrando cada vez mais ciumento, e isso se agrava com o nascimento do filho, que se torna a cada dia, segundo ele, mais parecido com Escobar.

A gota d’água para ele – e prova da traição de Capitu – é o modo como ela olha para o defunto Escobar, em 1871, quando este morre afogado. A partir daí, o relacionamento entre eles não é mais o mesmo: Bento pensa ora em suicidar-se, ora em matar Capitu e o filho, mas não tem coragem.

No entanto, acusa Capitu de traição e resolve pôr fim ao casamento. Viaja então com a esposa e o filho para a Europa, onde os estabelece e retorna sozinho ao Brasil.

Nunca mais vê a esposa. Aos poucos, Bento perde todos os entes queridos: D. Glória, José Dias, prima Justina, Capitu e, finalmente, o filho Ezequiel, que morre de febre tifóide em uma expedição arqueológica ao Egito. Assim, Bento abandona-se à solidão e à amargura, tornando-se o Dom Casmurro.

Com a publicação da obra, grande polêmica é criada: houve traição? E esta questão permanece para os leitores de todos os tempos. Se, por um lado, alguns fatos evidenciariam que ela se efetivou: como a personalidade de Capitu – os olhares e tudo o que causava o ciúme do marido – e a semelhança do filho com o amigo, Escobar; por outro, Capitu não tem defesa. Toda a história é narrada por um homem doentiamente ciumento e advogado, ou seja, com os atributos para guiar os fatos ao seu favor. Assim, não podemos condenar alguém sem conhecer a sua versão dos fatos, e só temos, unilateralmente, a visão de Bento.

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http://www.educandusweb.com.br/neteducacao/portal_novo/?pg=pesquise/artigo&cod=2014

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